Reunir Susana Vieira, Carolina Dieckmann, Marjorie Estiano e Mariana Ximenes numa só produção não é pouca coisa. E ainda mais mostrar as quatro estrelas sem glamour, totalmente expostas. Foi isso que a diretora Amora Mautner procurou fazer na série “Eu que amo tanto”, que estreia hoje no “Fantástico”.
— A gente está nua e crua . A proposta dela é esse despir, essa entrega total e absoluta — descreve Mariana, que trabalhou com Amora em “Joia rara”, indicada recentemente ao Emmy internacional.
Também do elenco da novela, Carolina concorda:
— A gente precisava estar em carne viva. Até porque, não teria outro jeito de contar essa história.
A história em questão, escrita por Euclydes Marinho baseada no livro homônimo de Marília Gabriela, mostra mulheres apaixonadas. Mas daquelas que rimam amor com dor, que perdem a cabeça, a saúde, laços de família e amizade pelo objeto do desejo.
— Nós escolhemos essas quatro atrizes que são muito bonitas e glamourosas, e a proposta foi: “Vocês querem se expor e se desglamourizar?”. Tem até uns peitinhos, uma nudez ou outra, mas eu digo nuas de alma — conta Amora.
Para a diretora, quem mais se despiu foi Susana, apesar de não tirar a roupa em cena. Ela surgirá no desfecho do episódio que protagoniza sem um pingo de maquiagem e com uma luz nada favorável.
— Eu acho que a Susana é uma das maiores atrizes do Brasil. Mas tem essa coisa do glamour, que pode criar um ruído. Acredito que o fato de ela ter encarado esse processo faz todo mundo ver uma Susana que ninguém nunca viu, que é uma grande atriz, independente do glamour ou carisma. Essa imagem final é um negócio chocante — adianta Amora.
Susana confessa que, apesar de nunca ter sentido a necessidade de se “desconstruir” dessa maneira, aceitou o convite sem titubear.
— Eu me entrego. Nem me olhei no espelho. Fiz o que a Amora e a Joana Jabace (que codirige a série) mandaram — afirma ela, para depois fazer piada com a diretora com quem também estará no próximo trabalho: — Mas tudo bem, volto linda e glamourosa na novela do João Emanuel Carneiro, não é?
No primeiro capítulo da série, que terá quatro episódios de dez minutos cada, Mariana vive Leididai, moça de baixa autoestima nascida numa família desestruturada que se apaixona pelo presidiário Zé Osmarino (Márcio Garcia).
— Ela se torna obsessiva e aí vem a doença. Seu raciocínio é tão passional que ela o denuncia para ele ir preso de novo, porque essa é a única maneira de ela o ter de volta, preso. E ela fala que a única maneira dela se sentir livre era entrando numa cadeia, já que, ali, finalmente encontrou o amor com esse homem que massacrou sua autoestima.
Mariana defende a série como um possível identificador de uma doença, na maioria das vezes, invisível. E acredita que muitas mulheres vão se identificar com o tema.
— Várias vão cuidar desse tipo de doença, que, às vezes, não é tratado como um desequilíbrio. Vai chamar a atenção de todo mundo para prestar atenção que isso é uma doença e tem tratamento, tem cura, e a gente não pode julgar — opina a atriz.
No dia 16, é a vez de Carolina interpretar Zezé, mulher que foi vítima de abuso na infância e conhece um homem mais velho quando adulta, ficando obcecada por ele. Na história, ela vai se anulando na relação e, por amar demais, aceita que Osório (Antonio Calloni) bata nela e se relacione com outras mulheres.
— Ela fica louca por ele. E cega ao mesmo tempo. Então, acho que vira doença a partir do momento que começa a fazer uma coisa que não toparia, que não gostaria, passando por cima mesmo dos limites dela para segurar esse homem que considera ser o grande amor da vida dela — analisa a atriz, que encarou cenas fortes, com direito a nudez.
Para dar ainda mais veracidade às sequências, Carolina leu depoimentos de mulheres que frequentam o grupo Mada (Mulheres que Amam Demais), que inspiraram o livro da jornalista Marília Gabriela.
— Li relatos de algumas mulheres do grupo para pegar esse tom, da doença. A mulher que procura o Mada é uma pessoa que se assume incapaz de conviver com aquilo, e isso é muito legal, você vê alguém doente mas consciente — destaca.
No terceiro episódio, Marjorie encarna uma oficial do Corpo de Bombeiros que larga marido e dois filhos para viver uma relação homossexual, marcada pelo ciúme doentio, com Cristiane (Paula Burlamaqui).
— A doença dela começa a partir do ciúme pela ex-mulher da personagem da Paula, mas acho que já vem de fragilidade anterior. Ela veio de um casamento onde estava tudo certo, completamente morno e cômodo — conta Marjorie.
Isso até encontrar a mulher que despertou o gatilho do ciúme e viver uma relação intensa com um colorido que ela nunca havia experimentado antes.
— Ela embarca por completo. Abandona os filhos com o marido. Fica completamente envolvida e cega. Passa a cobrar tudo e começa a ouvir vozes e a ter surtos histéricos — relata.
Encerrando a série, no dia 30, Sandra (Susana) é uma viúva que não se lembrava mais do amor até conhecer o fotógrafo Miguel (Tarcísio Filho), que acaba a desprezando.
— Ela levou uma vida de mulher casada com um homem doente dentro de casa. Daí, entra em cena uma pessoa mais jovem e a trata bem apenas por abrir a porta do elevador e ela fica apaixonada. Bem diferente de mim, que chamo o táxi, carrego compras do mercado. Para mim, esse tipo de homem não faz falta. Eu quero é continuar sendo feliz até morrer, inclusive de cílio e rímel azul — gargalhada Susana.
A história fez Susana recordar uma situação por que passou na vida real, com seu segundo marido, Carson Gardeazabal, com quem viveu por 17 anos até 2003. Mesmo já estando separada, a atriz o ajudou a se recuperar de um grave acidente que o deixou em coma:
— Ele acordou no hospital e se esqueceu de que tinha se separado de mim e quis ir para a nossa casa. Quando eu vi, ele estava na nossa casa de volta. Quando saiu lá de casa, já estava tudo misturado, eu não conseguia me apaixonar por ninguém. Acho que isso é um gesto de amor. Hoje eu sou madrinha do filho dele com outra mulher.
Ao analisar o destempero de Zezé, Carolina revela que teve seus momentos fora do eixo. Foi em 1999, logo após o nascimento do primogênito, Davi, da sua união com Marcos Frota, encerrada em 2003:
— Fiquei tão louca por ter gerado, por ter visto aquela criança nascer. Me lembro do médico falando que eu precisava dormir senão o leite ia secar, e aí eu escondia o remédio que ele me dava dentro da boca. Não queria dormir, era decisivo, não queria perder nenhum momento. Queria ficar direto com o meu bebê. Fiquei 14 dias sem dormir.
Depois de muita insistência das colegas e da diretora Amora Mautner, Mariana também revela um momento de destempero:
— Não sei se é um desequilíbrio. Eu estava numa festa, tive uma situação, olhei para pessoa e quebrei uma taça de champanhe. Ele me provocou isso.
A imagem da tranquilidade, Marjorie surpreende ao revelar que também já passou dos limites por amor.
— Já gritei, fiz escândalo na rua, quebrei casa, já passei do meu limite. Acho que é comum a todos. Depois que termina é que a gente percebe o quanto se permitiu passar por situações ou ceder em lugares que eram agressivos e violentos para você — constata.
Fazendo questão de dizer que não ia citar nomes, Susana citou a relação com o ex-marido Marcelo Silva, encontrado morto em um apart-hotel meses depois do rompimento com a atriz, em 2008. Ela admite que a paixão se tornou uma droga.
— Não tinha ideia que estavam acontecendo coisas em volta com aquele homem. Quando a pessoa morreu é que vieram me contar, e eu fiquei muito p... de ninguém ter me avisado. Ele fez isso, ele fez aquilo, diziam. Fiquei tão apaixonada que não via nada. A paixão era a droga. Você sabe que o homem era drogado e você não vê isso. Eu participei, quando deveria ter caído fora. Esse anos que você leva para sair é que são a loucura da gente — explica.
Voltando à ficção, Carolina diz ter se sentido confortável durante as cenas mais quentes com Antonio Calloni, justamente porque a história pedia isso.
— Não tenho problema com nudez. Já fiz de peito, e eu já tinha feito uma cena de estupro no início de “Salve Jorge” em que minha roupa era rasgada. Eu acho que é uma questão mesmo da censura da TV, não é uma falta de despojamento ou desprendimento dos atores — opina.
Mariana também encarou as sequências mais ousadas da sua personagem, que surge com os seios à mostra, com leveza e bom humor.
— Vocês viram, né? Sem plástica e ainda dá — brincou na coletiva de apresentação da série, na última segunda.
Autora do livro que deu origem à série, Marília Gabriela acha que o comportamento doentio de algumas mulheres é uma questão hormonal e cultural.
— Enquanto eu conversava com as mulheres do Mada, é que fui percebendo o quanto eu era semelhante a elas e o quanto a sociedade, a cultura como um todo, fez com que eu e a maioria das mulheres aparentemente se controlasse no momento do grande descontrole, que é do se rasgar, de querer que a pessoa ame você de qualquer maneira, mas acho que é uma característica absolutamente feminina
Marília conta que tentou fazer uma versão masculina do livro, mas esbarrou numa particularidade dos homens.
— Por uma razão muito simples: essas mulheres que estão aqui hoje são mulheres que padecem de falta de afeto. Então é uma capacidade que nós mulheres temos por dar, florear e necessitar, o que os homens resolveram por outras válvulas.